Concluímos a coluna anterior referente a este assunto (sim, porque semana passada tive que interromper a sequência de colunas sobre processadores em virtude da necessidade de divulgar um evento ainda a tempo de que fosse visitado pelos leitores) prometendo explicar porque os processadores esquentam, como fazer para dissipar o calor gerado e, o mais importante, como reduzir esta produção de calor para impedir que ela, literalmente, derreta o chip. Então vamos ao trabalho.
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Antes, porém, um comentário. Fabrica-se microprocessadores usando a técnica de circuitos integrados há quase cinquenta anos (o primeiro, o i4004, foi fabricado pela Intel em 1971) e de lá para cá a tecnologia evoluiu extraordinariamente. Surgiram técnicas sofisticadíssimas para contornar certos problemas e um processador fabricado nos dias de hoje sequer é parecido fisicamente com o velho i4004 (veja-os na Figura 1, o 4004 à esquerda e um Intel Core i7 com arquitetura Haswell à direita). Isso sem falar nos detalhes técnicos.
Nosso objetivo, aqui, é exclusivamente entender um fenômeno: porque os processadores esquentam e o que fazer para minimizar esta produção de calor. Fenômeno este que gera um problema que vem atormentando os projetistas de microprocessadores desde sempre. Então vamos nos ater às condições genéricas, as mais simples, portanto as menos modernas. Questões como a arquitetura interna tridimensional dos processadores e a multiplicidade de núcleos, embora importantes para o aumento da rapidez de processamento, vão ficar de fora – do contrário esta série de colunas ficaria como a espada de Affonso Henriques: comprida e chata.
Porém, quem estive interessado nos detalhes da fabricação e funcionamento dos microprocessadores pode visitar a seção Escritos do Sítio do Piropo (bpiropo.com.br/escritos), clicar no atalho “Coluna em Fórum PCs” e consultar a série “Lei de Moore: até quando?”, iniciada em 07/02/2005 – sempre levando em consideração que foram escritas há dez anos, que muitas das previsões ali contidas hoje já são técnicas ultrapassadas e algumas sequer se concretizaram. Mas os princípios básicos ali citados continuam vigendo.
Agora, sim, vamos adiante. Por que os processadores esquentam?
Processadores esquentam pela mesma razão que as lâmpadas incandescentes esquentam: porque, em seu interior, se formam correntes elétricas que atravessam condutores elétricos que, por sua vez, oferecem uma resistência natural à passagem dos elétrons em movimento (ou seja: da própria corrente elétrica, cujo nome é bem apropriado já que consiste em um fluxo, ou corrente, de elétrons atravessando um meio condutor que lhe oferece certa resistência).
Pois bem: a quantidade de calor gerada pela corrente depende diretamente da potência consumida para vencer a resistência.
Não dá para descer a detalhes aqui sobre o que vem a ser “potência” do ponto de vista técnico, mas todos temos uma ideia razoável do que ela representa do ponto de vista prático: uma lâmpada incandescente que ilumina mais consome mais potência, assim como um caminhão que transporta uma carga mais pesada. No que toca aos microprocessadores, consome mais potência aquele capaz de efetuar o mesmo processamento mais rapidamente.
Portanto, quanto maior a capacidade de processamento, maior a potência consumida e maior o calor gerado, já que a potência consumida se dissipa sob a forma de calor. E, como vimos na coluna anterior desta série (reiterando o que foi dito no início desta coluna: de forma muito simplificada e ainda não levando em conta as tecnologias modernas), a rapidez do processamento depende primariamente da frequência de operação do processador. Portanto, quanto maior a frequência, maior a potência consumida.
Por outro lado, conceituar a potência do ponto de vista elétrico é muito simples: como sabe todo estudante de física elementar a potência elétrica P dissipada por uma corrente elétrica que atravessa um condutor de resistência R provocada por uma tensão V é dir
Eu estou simplificando tanto quanto possível posto que o objetivo desta série é explicar para leigos porque a espessura da camada de silício é tão importante na fabricação de microprocessadores, mas um mínimo de complicação é inevitável. Mas se você não entendeu alguma coisa aí em cima, não se preocupe. Tudo o que é necessário saber se resume a um encadeamento de conceitos elementares, todos de facílimo entendimento, a saber:
- os fabricantes querem produzir microprocessadores cada vez com maior capacidade de processamento;
- como a capacidade de processamento depende diretamente da frequência de operação do processador, a tendência é produzir “chips” com frequências cada vez maiores;
- na medida que cresce a frequência de operação, cresce a potência consumida e, por via de consequência, cresce a quantidade de calor dissipada – o que implica o aumento da temperatura do chip até valores insuportáveis pelo circuito;
Ora, isto quer dizer que caso a geração de calor não venha a ser controlada, ela limitará o aumento da capacidade de processamento dos microprocessadores.
A geração de calor pode ser controlada de duas formas: ou diminuindo o calor produzido ou dissipando este calor na atmosfera o mais rapidamente possível, antes que ele se acumule no “chip” e cause o aumento descontrolado da temperatura.
O segundo ponto, nos micros de mesa, é controlado usando enormes dissipadores de calor, peças metálicas dotadas de aletas encimadas por uma potente ventoinha. O calor se difunde do núcleo do chip para o dissipador e se espalha por suas aletas de onde é removido pela corrente de ar gerada pela ventoinha (já nos modernos tabletes e micros portáteis esse recurso é limitado e a única forma de controlar a temperatura é reduzindo a quantidade de calor gerada pelo microprocessador, o que vem obrigando os fabricantes a projetar “chips” que consomem cada vez menos potência; mas estes tópicos, como combinamos lá em cima, estão fora do escopo destas colunas).
Resta então controlar a produção de calor agindo sobre seus dois fatores básicos: redução da tensão de alimentação do “chip” ou da resistência elétrica que se opõe à corrente.
O velho i4004, tataravô dos chips modernos, era alimentado com uma tensão de 5 Volts e operava com uma frequência de 740 KHz (sim, quilohertz, não mega ou giga – quilo mesmo). À medida que se aumentava a frequência de operação, a tensão foi se reduzindo e os efeitos desta redução se manifestaram rapidamente, já que a potência dissipada dependia do valor da tensão elevado ao quadrado. Hoje, as tensões de alimentação estão abaixo de um Volt e dificilmente poderão ser reduzidas ainda mais, pois é a tensão, ou “diferença de potencial elétrico”, que “empurra” os elétrons através dos condutores, gerando a corrente. Se baixarmos ainda mais a tensão, a resistência dos circuitos internos do “chip” impedirá a corrente elétrica de fluir através desses circuitos.
Ora, como os fatores responsáveis pelo aumento da potência são a tensão de alimentação e a resistência do circuito, não se podendo reduzir mais ainda a tensão de alimentação, resta agir sobre a resistência interna.
E essa resistência é diretamente proporcional à espessura da camada de silício sobre a qual é gravado o “chip”.
Portanto, quanto mais fina a camada de silício, menor a resistência elétrica e maior poderá ser a frequência de operação do “chip”.
Não entendeu esta última parte?
Então espera pela próxima coluna da série, onde discutiremos a forma pela qual se fabrica um microprocessador.
Até lá.
B. Piropo
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